🔗 Sexta-feira, 12 de fevereiro
Metrô do Rio, tarde de sexta-feira pós-carnaval. (Pós? O fim de semana está aí pra quem ainda tiver energia.)
Um grupo de quatro rapazes daquele estilo “carioca sarado”, bronzeados, camisetas regatas, óculos escuros, latinha de cerveja na mão, entram no carro. Batendo papo, dando risadas. Mas sem fazer muito escarcéu, como se cientes de que, para muita gente não tão sortuda quanto eles, o carnaval já acabou.
O trem chega na minha parada. Levanto para sair. Enquanto eu chegava na porta, um dos rapazes lê a estampa nas costas da minha camiseta e grita:
— Software livre!
Eu nem me viro, apenas ergo o braço direito com o punho cerrado, aquele antigo gesto de irmandade de tantos grupos de resistência.
Os rapazes não resistem e fazem um pequeno escarcéu soltando gritos de aprovação enquanto eu saio do trem.
🔗 O mundo não acaba na fronteira
Sempre me entristece quando eu lembro de como as notícias promovem uma visão de mundo que, bem, não é uma “visão de mundo”, mas só do nosso próprio umbigo.
Ilustro com dois episódios:
Enchentes no sul. Acompanhamos as notícias sobre as enchentes no sul do Brasil. Vi imagens, relatos sobre estado de emergência, reações do governo, etc.
Mas se não fosse a Al Jazeera English não teria visto nada sobre a real escala do que aconteceu:
“South America: Over 160,000 flee worst floods in 50 years
Paraguay, Argentina, Uruguay, Brazil and Bolivia have been battered by heavy rains blamed on the El Nino phenomenon.”
Zika vírus. Eu ligo a TV e vejo manchetes sobre a epidemia do zika vírus, especialmente na região Nordeste e sobre como ele está se alastrando pelo Brasil.
Mas se não fosse a internet não teria visto nada sobre isso:
O mundo não acaba quando chegamos na linha imaginária da fronteira nacional. As pessoas sofrendo do lado de lá são tão gente quanto as que estão sofrendo do lado de cá.
Uma vez tive uma discussão sobre isso com não-lembro-quem, que me dizia que o importante era se preocupar com as questões brasileiras em especial, onde eu precisei insistir: “por que a vida de uma pessoa que eu não conheço, totalmente estranha pra mim, que mora em Rivera, Uruguai, seria menos importante pra mim do que a vida de outro estranho qualquer que mora em Santana do Livramento, RS, Brasil, separados por apenas uma rua?”
🔗 Os hábitos do software livre…
Li um post de um amigo no Facebook e deu vontade de editar corrigindo um errinho de português (reflexo de ler a Wikipedia, onde eu posso fazer e faço isso).
Aí pensei que como o texto está no nome dele então não seria legal editar direto, mas sim editar uma cópia e enviar um “pull request” pra ele onde ele pudesse ver as mudanças e aceitá-las, atualizando o próprio post em um click (como acontece no Github, site de compartilhamento de código de software livre onde tenho meus projetos). Infelizmente o Facebook não oferece esse recurso.
Por que o mundo em geral não é mais como o mundo do software livre? A Wikipedia tá aí pra mostrar que, se você der pras pessoas ferramentas para atuar colaborativamente, um número suficiente de pessoas vai usá-las de modo a produzir resultados fantásticos.
🔗 Leituras no ônibus
Ônibus lotado, cheio de pessoas nos seus telefones. Me ocorre o pensamento de que hoje se lê mais. Sim, de que o número de palavras por dia que as pessoas leem hoje, se contarmos tudo, Facebook, Whatsapp, deve ser maior do que em outros tempos.
Olho à volta, há uma senhora lendo um jornal, daqueles de papel. Pensei: “bom, talvez ela seja daquelas pessoas que não fez a transição pra vida digital”. O assento ao lado dela libera, eu sento.
Li uma coluna do segundo caderno, como papagaio de pirata. Obrigado jornal pelas letras grandes. Vejo outra pessoa deixando um comentário no Facebook. Se bobear hoje as pessoas escrevem mais também.
A senhora guarda o jornal na bolsa, acabou a leitura dela e a minha também. Pega o telefone. Achei que estava olhando a lista de contatos para fazer uma ligação, mas era o GMail. Uma rápida checada na caixa de entrada e ela volta para a home screen. Entra no Whatsapp. Ela tem um grupo chamado “Colegas do C. São José 1960”. Eu paro de espiá-la e pego meu telefone pra escrever.
🔗 Quem não tá entendendo o que tá rolando, só imagine…
Compartilhando o post de Heitor Korndorfer, que eu havia compartilhado no Facebook anteriormente e que desapareceu durante o dia de hoje, aparentemente por causa de um bug no Facebook.
Segue o post do Heitor abaixo:
Quem não tá entendendo o que tá rolando, só imagine:
- Você é professor, se fode pra caralho, e paga há anos uma parte do seu salário para o fundo de previdência estadual.
- Um governador QUEBRA o estado financeiramente. Ele e integrantes de sua família são investigados por corrupção. Jornalistas que investigam o caso são ameaçados de morte. [1]
- Este governador precisa de dinheiro pois não consegue nem colocar combustível nas viaturas da polícia do estado. [2]
- Onde ele vai arranjar dinheiro? Exatamente no fundo que você pagou durante toda a sua vida para a sua previdência. Para efetivar esse roub.. quer dizer, artifício, ele precisa mudar a lei.
- Ele tem a assembleia legislativa aos seus pés, e com trocas políticas garante que os deputados vão aprova-la.
- Você fica puto, pois se essa lei for aprovada, os pagamentos da previdência só ficarão com fundos garantidos até 2021. Ou seja, ele vai usar o dinheiro da SUA aposentadoria para consertar o rombo que ELE MESMO criou, e você poderá ficar a ver navios nessa.
- O que fazer? ÓBVIO, você entra em greve. Aí ele mexe uns pauzinhos para o pessoal do judiciário mandar os professores de volta as aulas e ameaça descontar seu salário.
- Você continua lá, vai lutar pelos seus direitos, não interessa o salário de hoje. Interessa a sua aposentadoria.
- Você volta pra casa assim.
[1] http://oglobo.globo.com/brasil/jornalistas-que-investigam-denuncias-de-corrupcao-pedofilia-sao-ameacados-no-parana-15914287
[2] http://www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/por-falta-de-pagamento-mais-viaturas-da-pm-ficam-sem-combustivel-4qrkthgxolxxkrjpra04n4t3i
foto: Gabriel Rosa/Secretaria Municipal de Comunicação Social
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